quinta-feira, outubro 12, 2006

20 anos sobre a morte de Ruy Cinatti ...

Poeta ímpar na literatura portuguesa do séc. XX, com um compromisso assumido com ele próprio, enleado no génio aventureiro do português andarilho, foi homem de acção e místico, e inventor de uma toada nova e de um ritmo aparentemente simples, características geradoras de uma obra admirável.

Quando o amor morrer dentro de ti,
Caminha para o alto onde haja espaço,
E com o silêncio outrora pressentido
Molda em duas colunas os teus braços.
Relembra a confusão dos pensamentos,
E neles ateia o fogo adormecido
Que, uma vez, sonho de amor, teu peito ferido
Espalhou generoso aos quatro ventos.
Aos que passarem dá-lhes o abrigo
E o nocturno calor que se debruça
Sobre as faces brilhantes de soluços.
E se ninguém vier, ergue o sudário
Que mil saudosas lágrimas velaram;
Desfralda na tua alma o inventário
Do templo onde a vida ora de bruços,
A Deus e aos sonhos que gelaram.
in Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa de Eugénio de Andrade1999 Campo das Letras